Arquivo de Novembro de 2009

Glossário, piracema

Postado por Vanessa Rodriguesem 30 de Novembro de 2009
    sf (tupi piraséma)

  1. Migração anual dos peixes rio acima, na época da desova.
  2. Reg (São Paulo) Rumor que fazem os peixes, subindo para a nascente do rio, nessa época.
  3. Cardume ambulante de peixes.

Lendas Vivas

Postado por Vanessa Rodriguesem 29 de Novembro de 2009

[Dona Martinha de Suruacá conta histórias da Comunidade]

Há botos que encantam mulheres, seres que assombram a mata e cobras gigantes que derrubam as embarcações. Histórias, mitos e lendas da Amazónia sussurradas na primeira pessoa para SinaisDaGente.

donamartinha

Dona Martinha recorda lendas, histórias e “visagens” da comunidade de Suruacá, no Rio Tapajós, no médio Amazonas.

Depois de um almoço de peixe de rio e farinha de mandioca ela não resistiu a contar as histórias que lhe tiraram, muitas vezes, o sono, na adolescência. A Lenda do Boto, uma das mais importantes do folclore amazónico é o tormento da mulher da região. Dizem que os botos se transformam em homens belíssimos que seduzem as moças. Que elas ficam enfeitiçadas. Quando elas aparecem grávidas e não se sabe quem é o pai, a dúvida desfaz-se porque, afinal, só pode ter sido o boto.


Lenda do Boto


Ninar, Povo Mura

Postado por Vanessa Rodriguesem 29 de Novembro de 2009

mura2Ao contrário do que “contam” muitos livros, os índios Mura não foram dizimados, não se extinguiram e resistiram contra quem os queriam destruir e contra as doenças que enganaram muitos parentes. O sangue da herança cultural dessa etnia guerreira e resistente, continua a exaltar-se pelo direito à terra, nas aldeias indígenas ao redor de Novo Céu, no Município de Autazes. Em 2008 um grupo de professores indígenas resolveu resgatar a cultura, saberes, tradições e costumes e com a ajuda de parceiros e do Ministério da Cultura fez um DVD e publicou um livro com a actualidade do povo.

Como por exemplo esta música de ninar…

Amazonas Rio-Mar

Postado por Vanessa Rodriguesem 29 de Novembro de 2009

amazonasrioPublicado no Diário de Notícias, 29 Nov’ 2009

Por Vanessa Rodrigues, Manaus

De Belém a Manaus são seis dias pelo Amazonas. Viagem a bordo de um navio que carrega viajantes à procura da Amazónia e gente a recomeçar uma nova vida

O navio mercante Santarém recolhe a âncora em Belém com três horas de atraso. Já há música alta na popa e cervejas na mão dos viajantes. Alguns lançam latas ao rio. O comandante Douglas (um norte-americano da Georgia que se apaixonou por uma brasileira, casou, separou-se e não saiu mais do Brasil para ficar perto da filha) avisa num português delicado, que agora é de vez. A viagem até Manaus já começou, pede desculpa pelo atraso e diz que é “normal”.

O que ele quer dizer, na verdade, é que os próximos seis dias terão 1300 km, com o rio Amazonas a servir de estrada, e pouco mais de duzentos passos, por dia, em corpo confinado: camarote-proa-estibordo-bombordo-popa. Haveria, porém, outras coisas nesta travessia Belém-Manaus – a mais famosa e movimentada da Amazónia – que ele não sabia que queria dizer. Coisas que estavam já nas entrelinhas e que, também, são quotidiano “normal”: um motor avariado que nos roubou um dia de viagem, centenas de bichos nocturnos que invadiriam o barco, sujidade, a pobreza da gente que o barco carrega, a comida tipo ração e aquele cheiro pestilento vindo das casas de banho.

Em frente, estão amarradas as dezenas de redes. É lá que dormem os que não têm dinheiro para pagar o bilhete de barco (é também lá que comem, defecam e se roçam em promiscuidade com a rede do lado) ou alguns estrangeiros iludidos com a ideia de viajar pelo Amazonas de rede (que balança violentamente sempre que o rio se enfurece).

Ao fim de seis dias o odor torna-se escatológico, insuportável. E o romantismo da viagem torna-se uma tortura. (A solução para enganá-lo ainda é o camarote). A mulher da limpeza atira com um líquido desinfectante lá para dentro. Não tem coragem de entrar para limpar. Não há controlo, nem denúncias da falta de higiene, apesar do cartaz na parede: “Disque denúncia”. Tudo é “normal”.

Lá fora, onde o cheiro é quente e doce, o Amazonas é uma valsa lenta. Nas margens, há crianças a brincar e gente que se lava. E há pequenas casas ribeirinhas de madeira que parecem de bonecas, assentes em estacas e que se chamam palafitas. Serão centenas, isoladas, até Manaus. Quem conhece os segredos deste rio conta que tem personalidade forte. É temperamental: desnuda margens e cobre de águas barrentas plantações inteiras. Depois, é um Rio-Mar vaidoso. Muda a paisagem por onde passa, quando quer, num vaivém de cheia e seca. No início deste ano fez um pacto com as chuvas e fustigou por mais de dois meses as margens, deixando várias famílias na miséria. Já se redimiu dando peixe abundante. Tem, ainda, a mania das grandezas. De uma margem à outra, pode chegar aos 50 quilómetros, por isso é o maior e o mais extenso do mundo. E quando menos se espera, ele sai dessa condição de prepotente e cai num confortante silêncio.

Como o daquela noite, apesar do ambiente pesado. Havia qualquer coisa estranha nos homens que olham de esguelha para o bolso dos outros à espera que se distraiam para surripiarem. Homens que viajam com pouco no bolso para começar uma nova vida. Como o Sandro, que está zonzo, bêbado. Diz que em Boa Vista, Roraima, é que há dinheiro. É lá que se vai fazer gente, para “quem sabe” realizar o sonho de ser polícia. Depois chora, bebe mais um gole de cerveja e conta que já foi travesti em Brasília, onde nasceu. Confessa que há “um homem” no barco “a recrutar para o garimpo de ouro”, ilegal. Ele não vai. Tem o corpo “seco”, fraco e “agora é de vez”, aquela viagem é o “recomeço”. “Acredita em mim?”

Vender de canoa

Postado por Vanessa Rodriguesem 29 de Novembro de 2009

Publicado no Diário de Notícias, 29 Nov’ 2009

canoa01Negócios que vêm de canoa pelo Amazonas

Por V.R., Manaus

Ela está na margem à espera que o barco passe. Apressa-se para o alcançar. E quando se aproxima, essa mulher de cabelos esguedelhados e corpo robusto agarra num gancho de ferro do tamanho da mão dela, encaixa-o no pneu que serve de bóia e, num ápice, atraca a canoa ao navio.

A criança que há pouco remava com ela, freneticamente, na pequena canoa, para alcançar a embarcação, entra no Navio Mercante Santarém que faz o trajecto Belém-Manaus, no norte do Brasil, e mostra uma caixa de esferovite.

Começa o pregão ensaiado. Tem camarão e uma polpa cor de beringela feita do fruto açaí para vender. Outras canoas começam a atracar da mesma forma. E uma mulher dá o alarme no barco. “Cuidado com essa gente que entra. Alguns são ladrões e eu já fui assaltada por eles numa travessia”.

A empresa do navio deixa que entrem. Muitos passageiros reclamam e sentem-se inseguros com estranhos a circular no barco. Feito o negócio, saem. As canoas que atracam oferecem o mesmo cardápio, outras com extras de banana frita ou castanha de caju. Há pequenas embarcações que nada vendem e ficam só perto do “Santarém” à espera que alguém atire comida, dinheiro ou roupa.

Povo Mura

Postado por Vanessa Rodriguesem 29 de Novembro de 2009

Quem é o povo Mura?

Vivem actualmente no estado do Amazonas, com uma população de 9.275 mil habitantes…

Localização: Habitat tradicional nas bacias dos rios Madeira e Purús. Hoje encontram-se localizados na Bacia do baixo rio Madeira, expressivamente no rio Autazes e baixo Purús no lago Ayapuá. Também existência de alguns grupos dispersos ao longo dessas bacias e que não se auto-identificam como povo Mura. Sudeste do Estado do Amazonas.

Histórico
Os MURA, como todas outras etnias do Amazonas, sofreram grandes devassas tanto em seus territórios quanto nos seus usos e costumes culturais. A história relata, com documentos comprobatórios, da participação e estratégias usadas pelos colonizadores para “limpar” áreas habitadas por grupos indígenas.

Adélia Engrácia de Oliveira, na introdução aos autos da devassa contra os índios Mura (1986:1) narra… “Sabe-se que eles, os quais faziam das canoas suas casas, que como “índios de Corso” abrangeram uma grande área de ação que se estendia da fronteira do Peru até o Trombetas, que se destacaram nas tentativas de rechaçar a invasão dos civilizados em seus territórios; sendo aguerridos, destemidos e usando táticas especiais de ataque, que enfim, com suas incursões e “correrias” atemorizaram a Amazônia do século XVIII, ficaram no entanto, historicamente conhecidos como os grandes vilões dessa região… E verdade que os índios Mura atacaram as canoas que iam ao comércio das “drogas do sertão”; que impediram o estabelecimento dos portugueses, a ação das missões e das guarnições militares em vasta região da Amazônia; que abrigaram vilas que então surgiam como as atuais cidades de ltacoatiara e Borba (rio Madeirá)”.

Para não perderem suas vidas e suas formas próprias de organização social, econômica e religiosa. Muitas vezes era defendendo suas vidas, suas terras e suas formas de pensar, sentir e agir que davam motivos para que contra eles se fizesse uma “guerra justa”, exterminando-os e facilitando a penetração e a expansão portuguesa na área amazônica, como ocorreu no caso dos Manaó.

Era de tal ordem o temor causado por este grupo indígena que o ouvidor Sampaio, intendente geral da Capitania de São José do rio Negro naquela ocasião, fez o seguinte comentário: (1) “conjeturo, que se não dá prompto e efficaz remedio para inteiramente profligar, e destruir esta nação, que por sua natureza conserva cruel, e irreconsiIiável inimizade com todas as mais nações, não exceptuando os índios: Que professa por instituto a pirataria, grassando por todos os lugares de público transito, em que deve haver maior segurança: Que nas suas guerras, e assaltos usa a mais barbara tirannia…: Que apenas dá quartel a algum rapaz, que depois de ferido, e impossibilitado de fugir, chega a captivar; e ainda assim para o reduzir a escravidão: Motivos estes que não somente justificão contra esta nação a mais infurecida guerra, mas que apersuade huma indispensável obrigação fundada no interesse, bem da paz, e segurança da sociedade universal das nações Americanas, e colonias deste continente: se não dá, digo, remédio a tantos, e tão universais damnos, ou se reduzirão a nada as colonias, e estabelecimentos dos rios Amazonas, Negro, Madeira e Japurá, ou experimentarão o estado de languidez, e diminuição, que necessariamente lhes causa o temor dos Muras, e por hum cálculo bem moderado se pode inferir, que o augmento, que tem, seria quadruplicado, e se seguros os moradores se applicassem à agricultura, ao commercio, e a navegação essencialmente necessaria neste paiz, para adiantar huma, e outro (Sampaio 1825:75-76).” Colocava-se, pois, na destruição dos Mura, a possibilidade de aumentarem e se expandirem as povoações da então Capitania de São José do Rio Negro.

De todas as tribus da Amazônia foi esta a que mais extenso território occupou espalhando-se das fronteiras do Peru até o Trombetas. Sendo que sua sede primitiva foi o rio Madeira. (cf. Nimuendaju, 1925:140)

Nimuendaju (1948:256) acredita que os Mura tenham procurado “proteção entre os “civilizados”, não só pelos ataques dos Munduruku mas também por causa das expedições punitivas, adoção de traços alienígenas e epidemias como sarampo e bexiga”.

Eram os Mura os únicos indígenas respeitados pelos ditos “civilizados” e, foi a ganância destes que transformou os Mura de pacíficos pescadores num terrível flagelo que durante mais de 100 anos pesou sobre grande parte do atual Estado do Amazonas.

Os Mura embora fossem massacrados, não desistiam da luta. Como bem ilustra o seguinte relato: Tropas colonizadoras surpreenderam uma maloca, às seis horas da tarde “deitando-lhe huma linha de cerco por água, e por terra. Os homens, rompendo a linha, fugirão: As mulheres com suas crianças, e todos os rapazes e raparigas lançarão-se à água aquererem ganhar huma ilha fronteira, em tempo, que ahi ainda não tinhão chegado as canoas (…) morrerão todos afogados em número de trezentos e tantos” (segundo um anônimo: cf. illustração 1826).

Os conflitos dos Mura com a sociedade regional culminaram com sua participação na Cabanagem, ao lado dos rebeldes. Os Mura sofreram tantas baixas que optaram pelo isolamento em regiões de refúgio, a exemplo do subgrupo Mura, os Mura Pirahã.

Darcy Ribeiro, (1979:37-41), relata que: “Os Mura habitavam primitivamente as terras da margem direita do médio Madeira onde enfrentaram os primeiros brancos que tanto subiam o rio vindos do Amazonas, como desciam, vindos de Mato Grosso. Graças ao sucesso de suas táticas de povo canoeiro, contra invasores que navegavam em pesados batelões, os Mura expandiram-se passando a ocupar um extenso território ao longo do Madeira até sua foz e daí pelo Amazonas e Purus acima, concentrando-se, principalmente, na região do AUTAZ. Desta posição, dificilmente acessível pelo intrincado sistema de lagos, furos e canais”.

Segundo Nimuendaju, guarnições militares foram criadas para fazer frente aos Mura e organizaram-se diversas expedições punitivas que anualmente os perseguiam em seus refúgios (Nimuendaju, 1925). Mas à força de guerrearem com os cristãos, os Mura, como tantos outros índios, acabaram por conhecer alguns dos seus elementos de cultura, como as armas de fogo e as ferramentas, a cujo uso se foram acostumando. A despeito disto e das baixas que sofriam, os Mura se conservaram independentes e hostís até 1784, quando surgiu na região uma outra tribo que lhe impôs sério revés. Eram os Munduruku, do rio Tapajós, que vinham expandindo-se para o rio Madeira. Vendo-se entre dois fogos, alguns grupos Mura procuraram espontaneamente uma vila “civilizada” propondo paz.

Cerca de quarenta anos após a redução, em 1826, escreve o anônimo que: “Está este gentio no Rio Negro em toda a parte em malócas, de mais, ou menos em número, e não se querem unir às Villas e lugares, pela opinião que entre elles há, que os querem escravizar como os outros Indios: opinião que he necessario desvanecer por meio das persuasões das vantagens que resulta da sociedade (cf. illustração). Mais adiante acrescenta: Com effeíto, ha quarenta, para quarenta e hum annos que esta tribu genntilica se congrassou comnosco, ainda não houve quem olhasse compassivo para estes miseraveis!! Convida-se aos gentios Maué, e Madurucú para formarem Missoens e dá-se-lhes Missionarios!!! Dir-me-hão: os Muras não se sugeitão à povoação. Que diligencias se tem feito para isso? Quantos Missionários se lhes tem dado para os agraciar e que se persuadão que he seu Missíonario? Nenhum. Alguns mandão baptizar os filhos innocentes nesta, e naquela Freguesia; que para o futuro vem a causar huma confusão, …com authoridade, soffrimento, e paciencia he possível concordar os animos, e pareceres, e tirar estes gentios da sua grocería, e estupidez; e formar com elles estabelecimentos estaveis, e rendosos, à que naturalmente he o seu temperamento analogo… Estão estes gentios preoccupados da idéia, que os Magistrados querem escravisallos, como tem por muitos modos encontrado. De nenhuma sorte consentem, que os filhos seus menores se apartem do seu seio… O genio bravo, e altivo, como transcedente dos seus maiores, sempre mostrão, …em todas as occasioens que os atacáo. Em 1818 vararão com huma flexa o Mineiro Alexandre pela barriga, quando se recolhia à Mato Grosso: que morrendo no Hospital da Barra, confessou, ser elle mesmo causa da sua morte, por ter tido a ousadia de tomar ao lndio a sua propria mulher. Em 1820 matarão à dous Soldados do destacamento do Crato, por lhes tomarem violentamente as suas montarias carregadas de tartarugas. Semilhantes à estes casos diariamente estão acontecendo. (illustração 1826).

Segundo Rodrigues & Oliveira (1977:09), os Mura havendo sido vitimados por epidemias, pelos ataques de guanições militares e civis, enfim, pelos efeitos dos contatos com os “civilizados”, os Mura que eram considerados um dos maiores grupos tribais da Amazônia e que por diversos meios procuraram evitar esses contatos, conforme foi mostrado anteriormente, acabaram por pedir a paz e se integraram aos povoados rurais das cercanias onde viviam, devendo ter diminuído muito em número e perdido grande parte do seu acervo cultural.

Características Culturais
Em decorrência dos dois séculos de intenso e violento contato com a sociedade regional; do forte processo de miscigenação da difusão de bebidas alcoólicas, etc., Os Mura foram sendo progressivamente absorvidos pela civilização com as vantagens e desvantagens que tal processo comporta, perdendo muito dos seus costumes originais.

Com base nos dados lingüísticos e localização geográfica, a tribo dos Pirahã assim como os Torá são conhecidos como subgrupo Mura. Neste informativo enfocaremos aspectos culturais do grupo Pirahã por terem maiores informações sobre eles e por estes não cedido ao contato permanente com os brancos, mantendo-se afastados dos núcleos regionais. Os Mura não tiveram o mesmo destino, dispersos em povoações regionais.

Rodrigues & Oliveira (1 977:10) chama a atenção para o fato da ergologia Mura Pirahã apresentar poucos elementos culturais quando comparada, por exemplo, com a dos índios do Alto Rio Negro (AM), os do alto Xingu (MI) e os próprios Munduruku (AM e PA) com quem tanto os Mura brigaram no passado e dos quais os Pirahã ainda tem lembranças, o que pode ser causado por duas possibilidades: a) perda de traços culturais face ao contato experimentado com os regionais, vítimas que foram da dominação de elementos da sociedade nacional e, também, com outros grupos tribais, como é o caso, por sinal, do uso do tabaco do paricá; o qual era lançado em pó dentro da caçoleta do cachimbo, sendo que o que se destina a tomá-lo, com as suas próprias mãos aplica a caçoleta a uma das ventas, enquanto outro assopra o tabaco com força pelo local, vindo por este modo a ser tão violento o efeito do tabaco assoprado que, a primeira assopradela, basta para os alienar dos sentidos e promover uma extraordinária descarga da pituíba (Ferreira, 1974:63), e que atualmente não mais é encontrado, b) conseqüência de um tipo específico de estrutura social e econômica pois os Mura-Pirahã, tal qual faziam os Mura há dois séculos, continuam a passar grande parte de seu tempo viajando em canoas, deslocando-se da terra firme para as praias que surgem na época das secas, sendo antes pescadores, caçadores e coletores do que agricultores, o que parece ter impedido o seu estabelecimento em aldeias mais ou menos fixas e, consequentemente, o surgimento de um material tecnológico mais elaborado (Rodrigues & Oliveira, 1977:12).

A organização social dos Mura é baseada em famílias extensas matrilocais. Antigamente o casamento geralmente era realizado com a prima cruzada e nesta ocasião, o homem simulava o roubo da mulher. Atualmente há um alto grau de miscigenação com a população regional.

Outra informação é que evitavam pronunciar o próprio nome e o de seus irmãos; não usavam termo de parentesco e utilizavam o nome próprio.

Atualmente, somente alguns elementos apresentam caracteres indígenas marcantes, e de um modo geral possuem estatura mediana. Apesar do alto grau de miscigenação, resultante do contato contínuo, não eliminaram-se totalmente as diferenças de ordem cultural. Os Pirahã mantêm a língua própria e o “modus vivendi” que os difere da população que os cerca. Observamos que entre os Mura os laços matrimoniais sucedem-se entre índios de etnias diversas, incluindo não índios.

Aldeia
Não se tem uma idéia exata dos antigos aldeamentos Mura. Bates e Craig chegam a fazer referências mais detalhadas das aldeias, quando dizem: O lugarejo, rio Amatari, na confluência do rio Amazonas com rio Madeira, consistia de cerca de vinte palhoças de paredes de taipa… (Bates, 1944: v.1, pg. 349) ou a cidade era constituída por um grupo de cêrca de 20 cabanas… (Craig, 1947:125), porém não mencionam se eram em círculo ou em alinhamento.

Habitações

Antigamente esse grupo, segundo alguns autores, viviam ora nos ramos das árvores na mata (southey, 1965:246), ora em redes atadas nos galhos vergados sobre a margem do rio (wallace, 1939:21 6), ou, então, em simples coberturas (Nimuendaju, 1948:267). Não construíam habitações sólidas e fixas (Bates, 1944: v.1 pg. 352) e as coberturas precárias, de palha, eram armadas sobre quatro esteios (Rodrigues, 1875:10).

Quanto ao subgrupo Pirahã localizado no baixo Maicí, suas habitações são de dois tipos: jiraus com e sem coberturas. Quando na praia do rio Marmelos, inicialmente as moradas são construídas sem tetos, constituindo-se apenas de jiraus utilizados para passarem o dia e dormirem. Quando as chuvas se tornam mais freqüentes é que os Pirahã providenciam a cobertura. Esta é constituída de quatro, seis, oito ou nove esteios fincados no chão e cobertos com palha de babaçu, sororoca ou caranã (Rodrigues & Oliveira, 1977:16).

Atividades de Subsistência

Antes a economia de subsistência e agora já engajada num sistema de troca extra-tribal. As atividades básicas são a agricultura, pesca, coleta e extrativismo. Os Mura são considerados exímios pescadores e caçadores, sendo esta sua maior fonte de subsistência.

Todo produto da agricultura é para ser consumido internamente, exceção de algumas frutas e a mandioca destinada à feitura de farinha, com excedente destinado a venda.

A pesca está toda comprometida com o consumo interno, a não ser a do pirarucu, que é salgado e destinado a venda.

A coleta de frutos silvestres, mel e castanhas é quase que totalmente voltada para o próprio consumo, enriquecendo a dieta alimentar. Algumas seringueiras lhes rendem algum dinheiro, bem como a extração do óleo da copaíba e corte de madeira.

A pesca constitui a atividade básica de subsistência do grupo, ela é praticada pelos Pirahã com arco e flecha ou timbó nas águas mais paradas dos lagos. Os peixes são consumidos assados na brasa, moqueados em forquilhas ou moquéns ou então simplesmente cozidos.

O trabalho na roça é uma atividade desempenhada.

Normalmente a técnica aplicada é da coivara, plantam principalmente mandioca, macaxeira, banana, jerimum, mamão, batata-doce, cana-de-açúcar e cará. Utilizam pequenas porções de terra em formas arredondadas, obtendo assim produto suficiente apenas para o consumo de cada família. Da mandioca preparam á farinha e fazem uso do tipiti.

Instrumental para Subsistência
1) Armas
Os Mura foram considerados os mais aguerridos da Amazônia. Ficavam de tocaia nas árvores e quando o inimigo passava caiam-lhe em cima com flechas, pois eram hábeis no manejo do arco e flecha.

Entre os Pirahã, os arcos são simples, sem enfeites. Os arcos são feitos de ingarana ou pau d’arco e, para sua confecção a madeira, após o corte, é. aplainada com terçado preso a uma forquilha, sendo em seguida levada ao fogo. Esta é uma atividade masculina. As mulheres cabe o fabrico da corda, feita a partir da envira.

Com relação às flechas fazem-nas com ou sem emplumação, sendo esta última modalidade a mais utilizada, pois, na maioria das vezes os Pirahã, pescam com arco e flecha, o que já não ocorre com a caça. Para este fim preferem os rifles.

O uso de zarabatanas é mencionado por Craig (1947:126)… “via-se uma zarabatana com que sopram fIechas ervadas”. Tais flechas foram também citadas por Carvajal e Acunã (1941:259). Hoje não mais são utilizadas.

Ainda a respeito de armas há uma referência bibliográfica feita por Souza (1873:145), sobre o murucu que é uma arma de guerra, feita de pau vermelho. Muito utilizada à época pelos Mura.

2) Armadilhas
Os Pirahã possuem dois tipos de armadilhas: a) o apito ou isca, constituído de um pedaço de flandres dobrado ao meio com um furo numa das extremidades para produzir som imitando a anta, cotia, macaco ou outro bicho que desejam caçar; b) a armadilha de tracajá, feita de madeira leve, em forma de torno, onde prendem a linha e o anzil que são jogados na beira do rio e amarrados nos galhos das árvores.

3) Moquens
Utilizam dois tipos: vara de madeira aberta no sentido longitudinal até cerca da parte mediana onde é preso o peixe e enterrada obliquamente no chão e jiraus de formas variadas.

4) Cestaria
Confeccionam cestos de carregar. Quando vão colher a mandioca ou caçar, preparam este cesto com palha de babaçu, de forma retangular, para transportar tanto a mandioca, cará e batata doce como frutos silvestres. Neste mesmo cesto colocam a mandioca dentro d’água para pubar.

Outro tipo, aliás o menos comum, de forma circular, feito de cipó ambé, com base triangular, é semelhante ao paneiro usado por outros grupos na região Amazônica e utilizado para colocar objetos pessoais. Fazem também peneiras, tipitís (feitos de arumã) e abanos de forma triangular, com trançado simples.

5) Transportes
O meio de transporte desses índios era e é essencialmente feito através de rio. Nos dias atuais, os Pirahã do Alto Maicí, ainda constroem canoas de casca de árvore marupá, da copaíba e do jabotá.

6) Adornos
Conforme Aires e Cazal (1943:236), os homens não só ornam os braços e pernas, mas ainda furam o nariz, orelhas e beiços, donde trazem pendentes, conchas, dentes de porco e de feras. Os Mura usavam também colares e cintos. Hoje em dia os ornamentos Pirahã são constituídos somente de colares, braçadeiras e anéis.

Rodrigues & Oliveira (1977-28) dizem que certos tipos de pendentes, além do caráter de adorno tem outras funções, como por exemplo a semente da seringa, que é utilizada para acabar com o medo.

As braçadeiras podem ser de palha, fio de algodão ou tira de pano. Os diademas de palha, de forma arredondada, semelhantes a outros que os antigos Mura usavam (Ferreira, 1974:61), ainda são feitos, pelos Pirahã e também por alguns Mura de Autazes, porém pouco utilizados.

Os anéis são fabricados do caroço de tucumã, tanto por homens quanto por mulheres.

Os cabelos são cortados com pente e tesoura, o que antigamente era feito com mandíbula de piranha no mesmo processo do corte com navalha.

7) Brinquedos
As brincadeiras infantis entre os Pirahã são uma forma de prepará-los para a vida adulta. É assim que se vêem meninos aprendendo a fabricação de arcos e flechas para as suas pescarias, com caráter de brincadeira, enquanto que as meninas brincam com fusos e ajudam a cuidar das crianças menores.

8) Instrumentos Musicais
Rodrigues & Oliveira (1977:11) encontrou entre os Pirahã flautas de “pan” com dois ou seis tubos de taboca presos com fios de envira que, segundo eles, às vezes tocam nos poracês (festas) realizados nos dias de luar. As crianças usam pequenos arcos como instrumento musical.

Situação Atual
Souza & Zuardi, analisando a situação atual do grupo Mura no município de Autazes, dizem que, pelos enfrentamentos em defesa territorial os Mura conseguiram além do decréscimo populacional, realçar e atrair para o grupo uma antipatia e sérios preconceitos que são demonstrados até os dias atuais. A visão do colonizador e os entraves para o processo civilizatório imposto por eles, são passados através de dados históricos, permeados de malquerença. Preconceito este comum no confronto entre populações etnicamente diferenciadas.

Os índios Mura, com exceção dos Pirahã, tem contato permanente com os “civilizados”, representados na forma de regatões, extrativistas e “motores” que cruzam o rio diariamente e que habitualmente param nas praias, onde os índios levantam seus tapirís e lá realizam um comércio, através de trocas de mercadorias e bens já introduzidos em sua cultura. É comum a troca de caças, peixes, por aguardente, açúcar e quinquilharias.

Os extrativistas param nas redondezas principalmente na época da coleta da castanha que vai de dezembro a abril.

Existem invasões territoriais e pesca predatórias nos lagos. Perda da autonomia cultural, da posse do território e engajamento em atividades produtivas regionais.

AtuaImente os Mura não andam nus. Os cabelos que antes eram aparados por mandíbula de piranha, atualmente são cortados com pente e tesoura, os homens aparam os seus bem rente, já as mulheres os deixam longos.

A cultura material está restrita a colares de sementes, miçangas, contas diversas e anéis de tucumã.
Os Pirahã usam ainda a prática da pajelânça e a pintura corporal é aplicada principalmente nas partes enfermas do corpo, quando necessário, e para isso costumam usar o urucum.

As habitações de um modo geral são simples e rústicas, possuem uma ou duas águas, armadas por oito esteios em forma de forquilhas onde são encaixadas as vigas horizontais. A cobertura é feita com folhas de babaçu ou soro-roca.

O despreparo dos índios para a vida urbana sem que lhe seja oferecidas condições de boa adaptação, leva ao conflito nas disputas pelo acesso aos frágeis equipamentos urbanos e é inevitável o choque de dois modos distintos de comportamento social e representação da vida: o indígena e o não indígena (Cariua).

Encontram-se num processo de negação étnica, envergonhando-se da identidade tribal. Todavia, o grupo Mura tem se empenhado de modo a reverter esse processo.

Nota:
1 – Os textos em negrito são transcritos no português utilizado à época.
Fonte: FUNAI/CGDOC-MANAUS

Fontes: Ministério da Justiça, Fundação Nacional do Ìndio, Povos Indígenas

Ouvir em SinaisDaGente Música de Ninar do Povo Mura AQUI

Lendas, Amazonas

Postado por Vanessa Rodriguesem 28 de Novembro de 2009

amazonas01Há controvérsias sobre quem realmente terá visto, pela primeira vez as guerreiras Amazonas, uma tribo de mulheres que habitava o Rio Amazonas,  então apelidado de “mar dulce”, por exploradores espanhóis. Há historiadores que afirmam que o navegador espanhol Orellana não combateu as Amazonas, como se conta recorrentemente, mas sim uma tribo de índios de cabelos compridos, auxiliados, na guerra pelas mulheres.

Frei Gaspar de Carvajal, que participou da expedição de Orellana, dá testemunho da existência dessas mulheres guerreiras. Esses relatos gaanham força na voz dos índios que descrevem a existência de uma tribo de mulheres guerreiras. Segundo se lê no “Portal da Amazônia”, os índios não falavam em “Amazonas”, até porque “não sabiam o que significava”.

Os índios falavam, sim, em Icamiabas, que significa “mulheres sem maridos”. As Icamiabas viviam no interior da região do Rio Nhamundá, sozinhas. Ali, eram regidas por leis próprias. A região era denominada por estes aventureiros de País das Pedras Verdes e era guardada por diversas tribos de índios, das quais a mais próxima das Icamiabas era a dos Guacaris.

De acordo dom pesquisas do folclorista Alceu Maynard Araújo, nesse Reino das Pedras Verdes, realmente, viviam em comunidade as Amazonas, mulheres guerreiras e trabalhadoras: caçavam, pescavam, faziam cerâmica, redes, tecidos; trabalhavam na roça, faziam armas.

A liderança dessa tribo estava a cargo de uma única mulher, que tinha também a responsabilidade religiosa. O reinado dessa líder era curto: só as virgens enter os 20 e os 25 anos poderiam disputar a liderança das Amazonas.

A cada cinco luas cheias, no mês de Abril (ou seja um período de 5 anos) haveria renovação na chefia da tribo.

Mas por que razão, esse lugar, se chamava Reino das Pedras Verdes? Porque era justamente daí que se originavam os muiraquitãs, as famosas pedras verdes… Dizia-se que as Icamiabas realizavam uma festa anual dedicada à lua e durante a qual recebiam os índios Guacaris, com os quais se acasalavam.

Depois do acasalamento, mergulhavam num lago chamado Iaci-uaruá (Espelho da Lua) e iam buscar, no fundo, a matéria-prima com que moldavam os muiraquitãs. Então presenteavam os companheiros com os quais tinham feito amor… Os que recebiam, usavam orgulhosamente pendurados ao pescoço. No ano seguinte, na realização da festa, as mulheres que tinham parido ficavam com as filhas e entregavam os filhos para os Guacaris… De qualquer forma, quando se pronuncia Amazónia, não se pode deixar de pensar em muiraquitãs e em mulheres guerreiras…

Era no Lago Verde que as Amazonas faziam seus muiraquitãs

Motivos semelhantes levam esse grande contingente populacional a se deslocar para Alter-do-Chão, uma vila turística localizada na margem direita do rio Tapajós e ligada por via rodoviária à cidade de Santarém.

O rio Tapajós possui características únicas entre os afluentes do Amazonas – suas águas são cristalinas – e, em frente à vila, com a descida das suas águas durante o verão, surge uma lagoa cor de esmeralda cercada por bancos de areia branca apropriadamente denominada de “Lago Verde”. O Lago Verde, também chamado de Lago dos Muiraquitãs, era ponto de passagem obrigatório das índias Amazonas.

Referência: Amazonas foi o nome dado às mulheres guerreiras da Antiguidade que habitavam a Ásia Menor e cuja existência alguns historiadores consideravam um mito. Segundo a lenda, elas removiam um dos seios para melhor envergar o arco, deixando o outro para amamentar seus rebentos, que, se nascessem do sexo masculino, eram impiedosamente sacrificados. Amazonas, aliás, quer dizer sem seios (“mazos”) em grego. No século XVI, essa designação foi dada a mulheres com as mesmas características, cuja existência histórica é discutida e que combaterem os conquistadores espanhóis no baixo-Amazonas.

Na realidade, isso pode ser o efeito do sol penetrando as águas transparentes e iluminando o fundo do lago, rico em nefrita.

Fonte: Portal da Amazônia

sinais na imprensa

Postado por Vanessa Rodriguesem 26 de Novembro de 2009

SinaisDaGente citado na imprensa e no mundo virtual…

Viagem Brasil Tur

sinais na imprensa

Postado por Vanessa Rodriguesem 26 de Novembro de 2009

SinaisDaGente citado na Imprensa e no mundo virtual…

Página 1

Lendas, Cobra Grande

Postado por Vanessa Rodriguesem 25 de Novembro de 2009

cobragrandeOs pescadores falam dela como um ser gigante que habita os rios da Amazónia para atormentar a vida das comunidades. Falam em redemoinhos, buracos gigantes no meio da água, embarcações enormes que se transformam, monstro das águas amazónicas.

A Cobra grande é uma lenda amazónica que fala de uma cobra colossal, também chamada Boiúna, que cresce de forma desmesurada e ameaçadora, abandonando a floresta e passando a habitar a parte profunda dos rios.

Ao rastejar pela terra firme, deixa sulcos que se transformam em igarapés.

Conta a lenda que a cobra-grande pode transformar-se em embarcações ou outros seres. Aparece em numerosos contos indígenas. Um deles conta que numa tribo indígena da Amazónia, uma índia, grávida da Boiúna, deu à luz a duas crianças gêmeas. Uma delas, má, atacava os barcos, naufragando-os.

Esta história tornou-se célebre no poema Cobra Norato, de Raul Bopp, sendo encenado inclusive, em teatros de vários países. A verdadeira cobra grande: a sucuriju ou sucuri é a temida anaconda da Amazónia: o seu comprimento pode atingir mais de 10 metros. Mata as suas presas por constrição, apertando-as até a morte.

Celebrizada nos filmes de terror, é temida pela população ribeirinha, pois habita as áreas inundáveis e é dotada de grande força, sendo capaz de neutralizar qualquer tentativa de defesa da vítima.

Fonte: Portal da Amazônia

Brasil Caboclo

Postado por Vanessa Rodriguesem 23 de Novembro de 2009

Excerto de um dos meus companheiros de viagem: “O Povo Brasileiro” de Darcy Ribeiro…(1995)

“Mais da metade da população original de caboclos da Amazônia já foi desalojada de seus assentos, jogada nas cidades de Belém e Manaus. Perde-se assim, toda a sabedoria adaptativa milenar que essa população havia aprendido dos índios para viver na floresta.

Toda a área desse sistema fluvial Solimões-Amazonas era ocupada, originalmente, por tribos indígenas de adaptação especializada à floresta tropical.
Em nenhuma outra região brasileira a população enfrenta tão duras condições de miserabilidade quanto os núcleos caboclos dispersos pela floresta, devotados ao extrativismo mineral vegetal e, agora, também ao extrativismo mineral do ouro e do estanho. Os seus modos de vida constituem um variante sócio-cultural típico da sociedade nacional.

A característica básica dessa variante é o primitivismo de sua tecnologia adaptativa, essencialmente indígena, conservada e transmitida, através de séculos, sem alterações substancias.
Com o surgimento dos seringais cultivados no Oriente e da borracha sintética, a exploração da borracha nativa tornou-se economicamente inviável. Desde então, o seringal só sobrevive graças a um protecionismo estatal que o mantém artificialmente, mas sem a preocupação de amparar a massa de trabalhadores nele engajada.

Os protagonistas desses esforços foram alguns lusitanos , muito neobrasileiros mestiços, e a indiada engajada como mão de obra escrava.
A reação indígena a esse tratamento desencadeou a guerra e o afastamento das tribos antes aliadas para refúgios em que se punham a salvo da escravidão.

Uma solução melhor seria encontrada com a instalação de núcleos missionários, principalmente jesuíticos, mas também carmelitas e franciscanos. Mas estes tiveram que lutar muito com os próprios colonizadores pra impor como a mais racional e proveitosa.
O convívio entre índios de diferentes matrizes impuseram a homogeneização lingüística e o enquadramento cultural compulsório no corpo de crença e nos modos de vida dos seus cativadores.

Foram, no entanto, reduzindo progressivamente as populações tribais autônomas, prela incorporação do sistema de contagio que as dizimava, vitimadas por enfermidade antes desconhecidas, pela guerra e pelo engajamento e desgaste no trabalho.

Foi surgindo uma população nova, herdeira da cultura tribal no que ela tinha de forma adaptativa à floresta tropical. Falava uma língua indígena, muito embora esta se difundisse como a língua da civilização, aprendida de brancos e mestiços. Como os índios, finalmente localizava e coletava na mata as especiarias cujo valor comercial tornava viável a ocupação neobrasileira da Amazônia e a vinculara à economia internacional.

Nenhum colonizador sobreviveria na mata sem esses índios que eram seus olhos, suas mãos e seus pés.
A Coroa Portuguesa esforçou-se por estabilizar a sociedade nascente, estimulando o cultivo de algumas plantas indígenas.

Desse modo, ao lado da vida tribal que fenecia em todo o vale, alçava-se uma sociedade nova de mestiços que constituiria uma variante cultural diferenciada da sociedade brasileira: A dos caboclos da Amazônia. Seu modo de vida, essencialmente indígena enquanto adaptação ecológico-cultural, contrastava flagrantemente, no plano social, com o estilo de vida tribal.

O pleno amadurecimento da nova estrutura societária só se deu co o rompimento da dualidade que a dividia em reduções missionárias e núcleos colonizadores.

A Coroa portuguesa, empenhada em consolidar a ocupação da Amazônia, construí uma rede de cidades urbanizadas e dotadas de serviços públicos e igrejas que chegaram a ser suntuosos para a região.

A dupla função dessa massa cabocla foi a de mão de obra de exploração extrativista de drogas da mata exportadas para a Europa. Foi também instrumento de captura e dizimação das populações indígenas autônomas.
Sobre o caboclo caíram duas ondas de violência. A Primeira veio com a extraordinária valorização da borracha no mercado mundial, lançando sobre eles gentes vindas de toda parte para explorar a nova riqueza.

Perderam sua língua própria, adotando o português. A segunda onda ocorre em nossos dias com a nova invasão da Amazônia pela sociedade brasileira, provocando o desalojamento dos caboclos das terras que ocupavam.

A percepção que índios e caboclos tinham do inimigo como seu opressor étnico adquire aqui a crueza de uma oposição racista que engloba todos os “homens de cor” numa só categoria de inimigos a serem exterminados.

Século passado a região amazônica volta a experimentar uma quadra de prosperidade, motivada agora pela crescente valorização nos mercados mundiais de um de seus produtos tradicionais de coleta: a borracha, com desenvolvimento da industria européia e norte-americana de automóveis.

Uma ferrovia é construída em plena mata, à custa de enormes sacrifícios humanos, a Madeira-Mamoré, que ligaria concentrações de seringueiras de Porto Velho até o Rio Mamoré.

Cada trabalhador engressava no serviço com sua feira e seu débito, que aumentaria cada vez mais com os suprimentos de alimentação, de remédios, de roupas providas pelo barracão. Dificilmente um seringueiro consegue saldar essa conta que o mantém em regime de servidão virtual enquanto possa resistir às terríveis condições de vida a que é submetido.

Em cada seringal, um grupo de caboclos amazônicos exerce as funções de mestre. Ensinam a identificar a seringueira, a sangra-la diariamente sem afetar-lhe a vida, a colher o látex e a defuma-lo cuidadosamente para formar as bolas de borracha.

A prosperidade da economia extrativista interrompeu-se, porém, abruptamente com a Primeira Guerra Mundial. Não se refaria jamais por causa da entrada no comércio mundial da produção dos seringais plantados pelos ingleses no Oriente.

A decadência da economia da borracha matou também as cidades que floresciam pela Amazônia inteira, provocando o completo abandono de algumas e a completa deterioração de outras. Sem produção básica para exportar, o comércio decaía, sobrevivendo apenas com o apelo a especulação e ao contrabando.

O desequilíbrio da economia regional, suas dificuldades de integração na vida do país e as precárias condições de existência de suas populações levaram os constituintes de 1946 a destinar uma parcela de 3% das rendas federais a um programa de valorização da Amazônia.

Tal como a pobreza do Nordeste árido fez do amparo federal uma “indústria da seca”, a penúria dos caboclos da Amazônia fez do “desenvolvimento regional” um rico negócio e um mecanismo de consolidação política da oligarquia local.

A tentativa de espoliação assumiu a forma de uma proposta, apresentada à ditadura pelo governo norte americano, de arrendamento da área por 99 anos com o fim de “estuda-la e comprovar experimentalmente as técnicas adequadas para promover o seu desenvolvimento”.


Darcy Ribeiro

Darcy Ribeiro foi antropólogo, romancista e político. Criador do Museu do Índio (1953) e fundador da Universidade de Brasília. Publicou várias obras:  “Línguas e Culturas Indígenas do Brasil” , “O Processo Civilizatório”, “Maira”, “O Mulo”, entre outras as origens e mazelas do povo brasileiro.

“O povo brasileiro” é para a História do Brasil uma das mais importantes obras de ciências sociais sobre a formação da identidade. É um livro que desvela, pormenoriza e criticamente, cada aspecto da formação da gente brasileira, das estruturas sociais e das características que fazem o imenso  e díspar Brasil .

“Nós, brasileiros, somos um povo em ser, impedido de sê-lo. Um povo mestiço na carne e no espírito, já que aqui a mestiçagem jamais foi crime ou pecado. Nela fomos feitos e ainda continuamos nos fazendo. Essa massa de nativos viveu por séculos sem consciência de si… Assim foi ate se definir como uma nova identidade étnico-nacional, a de brasileiros…”
Darcy Ribeiro

MST luta pela terra

Postado por Vanessa Rodriguesem 22 de Novembro de 2009

“Preferimos morrer a desistir de lutar pelo direito à terra”

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Publicado no DN a 22 de Nov’

Por Vanessa Rodrigues, Marabá

A desconfiança reina na sede do MST em  Marabá. Talvez porque muitos “companheiros” vivam sob ameaça de morte.

A polémica estrada transamazónica, que corta a cidade de Marabá, no Sudeste do Pará, no Brasil, passa em frente ao hotel Porto Bello. Ao redor, bombas de gasolina, mecânicos, terra cor de cobre, alagada e malcheirosa, como se estivesse há muito com as feridas abertas, em putrefacção. É uma região “perigosa”, “tensa”, que leva o apelido de “Marabala”, por ser “terra de pistoleiros”, ainda.

São 09.00 e Giselda, do Movimento dos Sem-Terra (MST), ainda não devolveu a chamada do dia anterior. Dois dias depois viria a autorização para conhecer o trabalho e a “luta” social do MST “pela terra”, no Acampamento João Canuto, a três horas de viagem pela precária estrada PA-150, mais a sul.

Há um clima de desconfiança na sede do MST. Palavras breves e a pergunta constante: “Está a gravar?” Giselda tem razões para desconfiar. Alguns membros do MST vivem sob ameaça de morte. Ela já viu “muitos companheiros” assassinados. “Os responsáveis continuam impunes”, diz, como quem diz que continuam à solta para continuar a matar. Depois, o MST tem “fama de corrupto”, “violento” e “perigoso”, sobretudo porque “ocupa” grandes fazendas, apropriadas “ilicitamente”.

Para Mercedes Queiroz, de 27 anos, responsável pela coordenação estadual do MST, é uma “imagem construída” pela “imprensa burguesa”. “Reivindicamos um direito garantido pela Constituição: a terra. E somos oprimidos por fazer cumprir a lei.”

A semana passada, por exemplo, integrantes do MST de Marabá foram “acusados” de terem destruído plantações na fazenda de Daniel Dantas, um famoso banqueiro brasileiro. O cenário de “opressão” a membros do MST, ressalva Mercedes, repete-se “constantemente”, por todo o Brasil. Mas nesta região o conflito pela terra é ainda “mais intenso”. Para Mercedes, as autoridades “fecham os olhos”. Mais do que “a luta pela terra”, completa, o MST reivindica uma “reforma agrária popular”.

O que isso significa? “É a transformação da sociedade a partir de uma reforma agrária.” É essa a “luta” do “Índio”, como é conhecido no Acampamento João Canuto. Magro, moreno, com rugas ao redor dos olhos, ele não muda o tom de voz, cerimonioso e seco para contar como “quase” morreu com seis balas no corpo.

Em Abril, ele e outros “companheiros” foram apanhados numa “armadilha” na Fazenda Espírito Santo, do Daniel Dantas. “Os jagunços [capangas] da fazenda”, conta, “fizeram alguns companheiros nossos reféns e disseram que queriam conversar connosco”, conta. Ele e “outros” foram “em marcha” até à Fazenda. Quando chegaram, “um canal de televisão” estava lá. “Ouvimos o gerente da Fazenda dar ordem para atirar e começaram a chover balas. Não tivemos forma de nos defender. As nossas únicas armas são a foice para trabalhar a terra”, desabafa. A maioria dos seus companheiros morreu no “massacre”.

O Índio foi “salvo” por um jornalista desse canal. “Ele disse ao pistoleiro que queria falar comigo. Deve ter tido remorsos e pediu para me socorrerem.” Ele diz que quer “conquistar” a terra “pela paz”. “Preferimos morrer a desistir de lutar por esse direito.”

mst1A longa luta do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra

O MST é um movimento social brasileiro, com inspiração marxista, que comemorou este ano 25 anos, formado em Cascavel, no Paraná, quando alguns trabalhadores rurais se organizaram para lutar por uma Reforma Agrária. O movimento existe em 24 estados e, até agora, 350 mil famílias conquistaram a terra “por meio da luta e da organização dos trabalhadores rurais”. Como funciona a ocupação de terras? “O colectivo da Frente de Massas”, conta Mercedes, “vai percebendo quais as terras do Governo apropriadas ilicitamente ou que não estão a cumprir a sua função social”. “Depois”, continua, o MST “sensibiliza famílias sem-terra” e elas passam a organizar-se num acampamento. “Resistem na terra, enquanto correm os trâmites judiciais de ocupação da terra”. Já o “assentamento” avança quando se “legaliza a terra a favor dessas famílias organizadas”. Depois, o “grande desafio” é avançar “produtivamente”, para “cumprir” a Reforma Agrária Popular, com base em princípios de “exploração ecológica”, esclarece.

Nota: na publicação do Diário de Notícias foi alterado, por decisão do editor, o nome de Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra por Movimento Sem Terra. Só quando foi publicado percebi a alteração. As duas designações são muito distintas e referem-se a movimentos sociais diferentes. No Brasil, Movimento Sem Terra refere-se aos movimentos sociais em geral de ocupação de terras, enquanto que o MST é uma organização estruturada com objectivos e linha política definida. Nesse sentido, a alteração induz em erro o leitor como se se tratasse da mesma coisa.

Lendas, Rio Amazonas

Postado por Vanessa Rodriguesem 20 de Novembro de 2009

rioamazonasContam os mais antigos que, há muitos anos, havia na selva amazónica dois noivos apaixonados que queriam viver juntos para sempre. Ela vestia-se de prata e seu nome era Lua. Ele vestia-se de ouro e o seu nome era Sol.

Lua era a dona da noite e Sol do dia. Havia porém, um obstáculo para aquele namoro: se eles se casassem o mundo acabar-se-ia. O ardente amor de sol queimaria a terra e o choro triste da Lua afogaria a terra. Apesar de apaixonados, como poderiam se casar?

A Lua apagaria o fogo? O Sol faria toda a água evaporar? Por isso, tiveram de se separar. Nunca puderam casar-se. Os noivos ficaram desesperados, a Lua de prata e o Sol de ouro. No desespero da saudade, a Lua chorou durante todo um dia e toda uma noite.

As suas lágrimas escorreram por morros sem fim até chegar ao mar. Mas o mar, com tanta água ficou furioso: ele não queria tanta água. A sofrida Lua não conseguia misturar as suas lágrimas às águas bravas do mar. Por, isso, algo estranho aconteceu. As águas escavaram um imenso vale, serras  levantaram-se. Um imenso rio apareceu. As lágrimas da lua formaram o rio Amazonas, o rio-mar da Amazônia.

Fonte: Portal da Amazônia

Tendas de Campismo/terra indígena

Postado por Vanessa Rodriguesem 15 de Novembro de 2009

Tendas de campismo são ‘terra indígena’ no Pará

Publicado no Diário de Notícias a 8 de Nov´

“Moicaracó! Moicaracó!”, chama pelo rádio o índio Ma ti Krê, cabelo negro, tatuagens nos braços, sapatilhas de marca, calças de ganga e bolsa de máquina fotográfica a tiracolo. A sala onde está sentado é insalubre, com cheiro azedo. As baratas rasam-lhe os pés, há roupa a secar nos fios eléctricos e várias tendas de campismo puídas estão armadas ao redor. Ma ti Krê insiste. Quer falar com o líder indígena da aldeia de Moicaracó, da etnia Kayapó. Ele é Xicrin, de uma aldeia perto de Marabá: são todos “parentes”. Ele tenta sintonizar o rádio: é “o único meio” que as aldeias indígenas no Brasil têm para comunicar entre si e com a Fundação Nacional do Índio (Funai) que lhes dá apoio. São 11 horas da manhã e Ma ti Krê, como muitos outros ‘parentes’ de outras etnias, espera na Casa do Índio de Ourilândia do Norte, no Sudeste do Pará, Brasil, uma resposta sobre se a aldeia Moicaracó será ou não homologada terra indígena, conforme anunciou a Funai para essa semana.

O Presidente Lula da Silva, que anda pela região num périplo de inaugurações com a chefe da Casa Civil, Dilma Roussef, a propósito do Programa de Aceleração de Crescimento, confirmou presença com uma comitiva de peso. Os ‘parentes’ estão entusiasmados com a cerimónia e concentraram-se em Ourilândia do Norte, que serve de ‘base’ para seguir para a aldeia indígena, a mais de 500 quilómetros dali. Até lá só há dois acessos: de avião da Funai ou de carro, com tracção a quatro rodas.

Depois de mais de dez minutos a tentar chamar Moicaracó ouve-se do outro lado da frequência um zumbido e uma voz rouca fala em Kayapó. “É Ai ki Boro”, reconhece Ma ti Krê, referindo-se ao líder indígena da aldeia e passa o transmissor. “Ai ki boro!. Daqui é a sua parente Célia Maracajá da Fundação Curro Velho de Belém. Haverá cerimónia?”, questiona. Ai ki boro garante que sim, que foi adiada “uns dias” e pede para a Célia contactar a Funai em Ourilândia do Norte para nos levar até à aldeia. Célia não está confiante. Despede-se de Ai ki Boro e, enquanto pousa o transmissor, arregala os olhos e torce os lábios como quem diz que alguma coisa está errada. Atrás dela, vários adolescentes estão com os olhos colados no ecrã de televisão. Um deles aproxima-se e pergunta-lhe quando ela dará outra aula de vídeo. Célia explica “o fascínio dos índios” pela imagem. “Eles têm um olhar incrível”, entusiasma-se. “Quando filmamos as festas de alguma aldeia indígena, eles pedem para ver a versão integral, sem edições, e são capazes de ficar horas a ver o filme, com um olhar intenso, genuíno.”

À porta da Casa do Índio, que funciona como um centro de acolhimento, estão acampadas, precariamente, dez famílias de várias etnias. Começam a chegar vários caciques – nome do líder indígena – de outras aldeias. O movimento aumenta. É hora de almoçar: chegam pacotes embalados que a Funai mandou entregar para os “parentes” que moram na Casa. Uma das mulheres indígenas leva dois: um para ela, outro para a filha. Pede dinheiro à Célia para comprar um refrigerante. Coloca o pacote embalado de comida no cimento que tapa o poço e vê-se uma mistura de farofa, massa, arroz, feijão e carne. Num primeiro olhar parecem restos de comida. Ela separa o arroz e a carne e atira o resto ao chão. Só fala Kayapó e pragueja algo que Ma ti Krê traduz. “Todos os dias comemos os mesmos restos, hoje só me apetece o arroz e carne. Amanhã é dia de feijão.”

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