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Postado por Vanessa Rodriguesem 26 de Janeiro de 2010

[Entrevistas sobre a Amazónia Brasileira]

O manauara Marco Lima é pesquisador em Ictiologia Amazónica, guia naturalista e filho da Amazónia. Anda preocupado com o impacto que a construção da nova ponte, que ligará Manaus a Iranduba, sobre o Rio Negro, terá no ciclo dos peixes amazónicos . Fala em falta de preservação, falta de políticas e falta de consenso sobre como deve ser gerida a biodiversidade num lugar onde, afinal, parece, não falta nada.

Por Vanessa Rodrigues

MarcoLima
– O que tem a Amazónia de tão especial?

É a grande caixa de pandora que a Criação nos guardou para descobrirmos agora no séc. XXI, que é a maior zona de Biodiversidade desconhecida do planeta. Não é apenas uma imensa floresta, mas uma floresta cheia de belas surpresas, para usufruto do ser humano, e que deve ser preservado para as próximas gerações.

– De sua experiência, o que precisa ser feito para preservá-la?

Reconhecer o direito das pessoas que já habitam a região e, a partir de agora, criar políticas para preservá-la, beneficiando essas pessoas: quer seja Índio, caboclo ou o imigrante que hoje planta a soja, pois eles já moram na Amazónia e conhecem-na como ninguém. E, depois, que o Governo Brasileiro crie condições e lhes dê oportunidade para o acesso à educação, com seus direitos e deveres, como populações tradicionais.

Qual a experiência que mais o marcou na região?

Quando jovem fui visitar uma Aldeia Yanomami, em Roraima. Esses índios tinham muito pouco contato com os Brancos. Isso foi em meados dos anos 80. Recordo um episódio em que, após ter comido, dei o meu prato de comida a um chefe yanomami. Chamou-o à atenção uma simples colher de alumínio – como se fosse um produto de alta tecnologia; como nós nos impressionamos ao ver um telemóvel ou um computador de última geração. Isso marcou-me muito. Esses índios foram quase que massacrados pelas invasões garimpeiras, nessa época.

– Qual a importância de suas pesquisas para a Amazônia?

Eu faço avaliações do impacto das queimadas, seja elas feitas por brancos ou por índios na vida da IctioFauna (Peixes) e seus impactos na reprodução dos peixes. Temos descoberto coisas bem negativas e de como isso está a ter um forte impacto na vida dos peixes.

– Por que é que a ponte que estão construindo em Manaus vai ter tanto impacto na vida dos peixes?

Como o ar, vento e chuva muda a rotina diária dos seres humanos, isso também ocorre com os peixes quando há mudança de correnteza. Os nossos grandes bagres migradores, que atingem mais de 3 metros, pesando acima de 250 quilos, poderão ter, com essa ponte, o seu ecossistema alterado, na subida do Rio Negro, pois eles na sua longa viagem anual pelos principais rios da Amazónia nunca haviam encontrado essa mudança.  Por mais absurda que possa parecer, a nossa natureza é muito desconhecida e os seus “hábitos” são extremamente delicados. Não aguentam certas mudanças, como se já não bastassem as Hidroeletricas do Madeira e essa nova corrida logística expansionista, pois onde elas chegam vem, também, o efeito cupim, fr destruição lenta, porém de grande impacto.

– O que você está fazendo pela Amazónia?

Tenho feito trabalhos para varias organizações entre elas para a União Europeia, no Fundo Amazônia, fazendo levantamentos sobre devastação em áreas alagadas, pois na Amazônia chega a alagar anualmente uma área com o tamanho de Espanha nos período de Dez a Junho. Faço parte, ainda, da “Fundação Floresta Viva”, levando consciência e educação ambiental Às populações ribeirinhas; e auxilio a BBC e a National Geograpic em seus programas em áreas isoladas da Amazónia.

– Histórias de sua passagem na região?

O que sempre me chamou a atenção foi o respeito que, no fundo, as pessoas têm pela selva; quer seja um madeireiro que todos os dias corta as árvores, ou um pescador que mata um gigante Pirarucu, na época em que ele está protegido. Podem, no entanto, escrever muita coisa sobre a Amazónia vivendo nela, dormindo e acordando aqui, respirando esse ar, mas faltará sempre papel para escrever o que vivemos e sentimos na Amazónia.

– Quais são os maiores problemas da Amazónia?

A falta de compromisso que todos têm para com ela, sobretudo quem dela e nela vive; a falta de políticas de todos os governos. Os únicos, realmente empenhados em preservá-la são os Militares  – que  cometeram muitos erros  no passado, mas hoje têm uma forte missão em preservá-la num Brasil sem tecnologia. Eles construíram a Transamazonica que fez 40 anos em 2009. A Amazónia precisa de um Ministério de investimentos, de atenção específica, pois todo o mal está à porta: o narcotráfico, a mineração ilegal, a Biopirataria. Precisamos de Governo na região, pois com ele se aplica a lei, e os direitos são garantidos. A Amazónia é um património do mundo que o Brasil foi sorteado para zelar.

Seca Amazonas

Postado por Vanessa Rodriguesem 13 de Dezembro de 2009

secamanausPublicado no DN, 13 Dez’ 2009

Por Vanessa Rodrigues, em Manaus

Depois das cheias que fustigaram o território em Junho deste ano, a seca chegou à região e anda a desequilibrar o ecossistema e a subsistência de famílias ribeirinhas. Mais velhos contam que há 60 anos que não se via nada assim.

Cheira a queimado, há fumo no ar e pequenas labaredas na mata. Para a nova colheita, a maioria dos agricultores da Amazónia lança fogo ao terreno para que o “roçado” volte a ser fértil. Planta-se mandioca, que este ano está com uma “praga” de minhocas devido à seca. A floresta, nas margens dos rios amazónicos, está árida e desgastada da exposição ao sol. A pouca humidade anda a preocupar os ambientalistas que falam em “grandes mudanças” no ecossistema da Amazónia.

O que se passa com a canoa de Saruê, como é conhecido Nelson Dalva na região, é um bom exemplo do que eles querem dizer. Enquanto atravessa o rio Ariaú, afluente do rio Negro, no estado do Amazonas, Brasil, peixes pequenos começam a saltar para dentro da canoa, em voos desordenados. Ele apressa-se a devolvê–los ao seu habitat. “Mesmo quem não sabe pescar, nesta época de seca, consegue apanhar peixe facilmente. Há muito!”, diz. Por outro lado, admite, “há cardumes a morrer”.

A rabeta (pequeno motor) quase encalha num banco de areia. As hélices rangem furiosas. A canoa segue à deriva até encontrar um nível de navegabilidade. Nas margens, a lama seca encobre-as e as raízes das árvores estão descobertas. Alguns troncos estão queimados pelo sol. Nos galhos das árvores há rastos de vegetação seca, que as cheias deixaram em Junho. As enchentes desalojaram centenas de famílias e trouxeram uma crise de abastecimento a Manaus, a metrópole que parece “engolida” pela selva.

Agora a seca rasga a Amazónia fluvial. Estão 37 graus. O corpo não pára de suar, como se quisesse mostrar que tem mais poros que aqueles que conhecemos. A garganta parece ter cactos a arranhar. E a tontura é companheira assídua. Não há chuva há cinco meses. “Nesta altura do ano, era suposto já estar a chover; e está este calor infernal”, diz Saruê. “A natureza está desequilibrada.”

O nível da água está “demasiado baixo”. Fala-se em seca “histórica”. Os mais velhos contam que “só nos anos 60″ houve um cenário semelhante. Ouve-se falar que há famílias ribeirinhas com falta de água”. Onde andam os fartos rios da Amazónia que dependem das chuvas para se encherem de farta correnteza?

No arquipélago fluvial das Anavilhanas, inabitado, a água desceu mais de 20 metros. Os canais fluviais, chamados de igarapés, estão secos. Em Iranduba, no outro lado da margem de Manaus, as cheias encobriram parte do mercado durante dois meses. Agora, a água desceu. As casas flutuantes, comuns nesta região, devido à grande alteração no nível das águas, assentam em terra firme. Na aldeia de Murutinga, a sul de Manaus, onde mora a comunidade indígena descendente dos Mura, o nível da água desceu 20 metros. Todos falam que “já devia ter subido”. “E este rio, o que se passa?”, questiona o Braga, que vive ali há 42 anos. “Quem o viu em Junho não o reconheceria. A paisagem é outra.”

Nessa altura, a água chegou até ao posto médico, no alto da aldeia e as enfermeiras encostavam o barco à porta de entrada. A casa fica, agora, no alto de uma falésia, como se alguém tivesse sugado toda a água e deixado um charco para disfarçar. Para o ecologista Carlos Durigán, presidente da Fundação Vitória Amazónica, a situação na região é “preocupante”. “A Amazónia é responsável pelo equilíbrio do clima mundial e está a sofrer muito com as mudanças climáticas”, diz. “Esta seca é a prova disso.”

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